Uma alegria de viver que contagiava a todos que chegassem
perto dela, assim era LIDIA MATTOS, tanto em carne e osso quanto pelas lentes
da televisão artesanal que ela ajudou a implantar. Começou no rádio, fez teatro
e cinema, mas foi na telinha que desenvolveu o carisma, a personalidade e o
talento de grande comunicadora assim como a atriz sensível que foi.
Simpatia e naturalidade atravessavam a tela refletindo a
sensação de intimidade com o telespectador de alguma parente ou pessoa muito próxima.
O tempo passou, e ela partiu nesta semana para o panteão da
glória pioneira deixando saudades eternas.
Foi quando escrevi o livro “TV Tupi, uma viagem afetiva”
para a Coleção Aplauso em 2010, que conheci LIDIA pessoalmente. Residindo no
Solar da Gávea, luxuoso residencial geriátrico, fui entrevistá-la, e a minha admiração transformou-se
em instantânea amizade, pois ela era toda doçura e sinceridade.
Que ser humano!
Depois do rádio, cinema e teatro, que esquentaram o
temperamento de uma jovem cheia dos talentos, ela estreou na televisão carioca em
1954, três anos depois da inauguração da TV Tupi canal 6, a nossa primeira emissora de
tv. No “Teletestes Lutz Ferrando”, programa de perguntas e respostas, ela
respondia dúvidas do telespectador em pílulas diárias. Logo em seguida, passou a comandar ao lado do marido, o
radialista Urbano Lóes e seus quatro filhos – Dilma, Tânia, Urbano Jr e Luis
Carlos - o programa “Eles estão em casa”
nas tardes de sábado do canal 6., que trouxe para o novo veículo o cotidiano de
uma família classe média igual a tantas da época. Identificação imediata.
A filha Dilma Lóes seguiu carreira e tornou-se cineasta e
atriz de cinema, televisão e teatro. No programa, a família parecia mesmo que
estava em casa, tudo era improviso, sem texto fixo, apenas um roteiro que
determinava os assuntos. Muita gente pensava que tudo era ensaiado e se surpreendia
com as cenas hilárias que rolavam. O maestro Villa Lobos, seu professor de canto orfeônico,
celebrou os 70 anos no programa e
tocou dois números ao piano.
Foi na Rádio Mayrink Veiga que ela conheceu Urbano Lóes. Ele
era o seu galã nas radionovelas, e assim, a proximidade do trabalho foi
além-microfones. Virou amor, amor eterno. Eles foram casados por 40 anos até
seu falecimento em 1980. Ela me contou que nestes anos todos ela pensava nele
todos os dias; e que estava recebendo visitas dele ultimamente. Falou sorrindo
com os olhos vivos me encarando.
LIDIA MATTOS também foi pioneira no cinema brasileiro. Seu
primeiro filme foi “Aves sem ninho” (1939), dirigido por Raul Roulien, quando
tinha apenas 17 anos. A seguir atuou duas vezes com Humberto Mauro: em “Argila”
(1940), no segundo papel feminino ao lado da estrela Carmen Santos, e “O
Despertar da Redentora” (1942), quando recebeu os maiores elogios por sua
interpretação como a Princesa Isabel. Filmou também com Moacyr Fenelon, Carlos
Hugo Christensen, Eurides Ramos, e na
estreia de Florinha Bolkan como diretora, LÍDIA ganhou o Kikito de melhor atriz
coadjuvante no Festival de Gramado, em 2000, por “Eu não conhecia Tururu”.
Mas o sucesso popular de LIDIA MATTOS foi confirmado quando
apresentou ao lado Murilo Nery o “Boliche Royal” (1956), os dois tinham uma
química no ar...Eles formaram a primeira dupla autêntica de mestres de
cerimônia da televisão.
O programa foi um sucesso, o auditório da Urca lotava de
jovens da classe média da zona sul que, munidos de envelopes de gelatina, derrubavam garrafinhas ao vivo e em
preto e branco para ganhar liquidificadores, geladeiras e vitrolas.
O poder de comunicação de LIDIA era grande, e seus
improvisos surpreendiam não só o público, como ela me contou para o livro:
-“Lembra do Al Neto, com cachimbo, meio prosa? Ele fazia “Encontro
com os Amigos”. Eu apresentava com ele e fazia o comercial como
garota-propaganda. Um dia ele estava entrevistando o Nelson Rockefeller, eu
cheguei e coloquei uma batedeira na mão dele: ‘Esta é uma batedeira Arno!’
Dizem que o João Calmon não gostou, poderia ter criado um caso diplomático, não
sei...”
Muito amiga da escritora Janete Clair dos tempos do rádio,
ela ganhou personagem especialmente para ela em “Selva de Pedra” (1972), na
Globo, a desembaraçada Vivi. Seguiram-se outras novelas na emissora: “Assim na
terra como no céu”, “Plumas e Paetês”,
“O Bem Amado”, “A próxima vítima” e “O primo Basílio”, entre outras.
Na TV-E fez “João da Silva” com Jacy Campos, novela
educativa.
A fotografia acima foi feita especialmente para o nosso
livro. São 4 gerações da família Lóes: LIDIA, Dilma, Vanessa e Cora. Vanessa
Lóes, casada com o ator Thiago Lacerda, tem dois filhos: Gael e Cora, no flagrante recém nascida. O clic é do papai Thiago. O
lado família sempre foi o aspecto mais forte da vida da grande atriz e
comunicadora LIDIA MATTOS, que deixou além dos 4 filhos, 7 netos e tres bisnetos. E como se orgulhava da família!
No lançamento de “TV Tupi, uma viagem afetiva” na Livraria
Travessa, sua presença foi um acontecimento à parte. Muito querida pelos
colegas, foi saudada e reverenciada por pioneiros de igual peso e importância,
como Almeida Castro, Maninha de Castro, Neyde Aparecida, Maria da Glória, João
Loredo, Luiz Vieira, Adonis Karan, Theresa Amayo, Ricardo Kathar, Neila Tavares, Marly Bueno, Mauricio
Sherman, Jomeri Pozzoli, Eloá Dias, Carlos Alberto Santos, Flavio Cavalcanti
Jr, Aracy Cardoso, Doris Monteiro e Maria Pompeu, entre outros.
Na foto, o reencontro com Maninha, a grande amiga, relembrando
os tempos de garota-propaganda que elas foram no início de tudo, cercadas pelos curumins Luiz José e Jorge Eduardo Vieira, filhos de Eurídice e Luiz Vieira.
Muito emocionado com sua partida, sinto-me compensado por
tê-la em meu modesto livro, e agora poder eternizá-la na web através deste
recorte, tributo sincero de um admirador.
Alegria, alegria, legado que LIDIA MATTOS deixou aos que com
ela conviveram de longe e de perto. Um sorriso que jamais se apagará.