quarta-feira, 26 de setembro de 2012

CAÇADA AO RACISMO: EMILIA NÃO É BRINQUEDO, NÃO...




É incontestável que a escravidão no Brasil foi um dos períodos negros mais negros da nossa história.
Extirpada em 1888  pela Princesa Isabel, sentimos até os dias de hoje o racismo, camuflado ou não, nas esquinas da vida...Claro que muita coisa evoluiu e o comportamento geral idem, mas é sempre tocante tocar no assunto que não se esgota.

Reflexo disso é a polêmica sobre o ‘racismo de Monteiro Lobato (1882-1948)’, acusado de exercê-lo pelo Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (Iara) e o educador Antonio Gomes Neto, que impetraram mandado de segurança impedindo que o seu livro “Caçadas  de Pedrinho” fosse distribuído às escolas da rede pública.


Mas, ‘se toda a unanimidade é burra’ como afirmava Nelson Rodrigues, a grande maioria que pensa é inteligente e atenta, pois está perplexa com tal polêmica. E indignada. A essas alturas do campeonato, uma lebre dessas é levantada sobre o maior escritor de literatura infantil brasileira, e justo no universo poético do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Nonsense puro. Ou punk paca.



 Mas, afinal, quem é essa figura abominável capaz de esculachar uma mulher negra, serviçal e super afetuosa como a tia Anastácia? É a maluquete da Emília, contestadora, faladeira, desaforada, “a torneirinha de asneiras”, como definia Lobato. Tia Nastácia, símbolo da bondade humana e da sabedoria popular, era alvo constante dos disparates desta ‘boneca periguete’...


Linguaruda de carteirinha, ela zoa direto com Tia Nastácia, por certo porque ela contesta suas peratilces... Emília não é brinquedo não! Joga tomate até nos grandes filósofos gregos com arrogância e soberba. Não poupa ninguém.


Tenho a impressão que o Iara e este senhor gestor de educação, estão vendo chifre em cabeça de cavalo. Se eles desconhecem a obra de Monteiro Lobato, e em especial da obra-prima Sítio do Pica-Pau e seus personagens arquétipos, não entendem que é apenas uma questão de contextualização, no more.
             
“O Sítio do Pica-pau Amarelo” faz a cabeça de gerações não tanto pela sua leitura, mas principalmente através da televisão. Desde 1952, quando rolou a primeira versão adaptada  por Tatiana Belinky na TV Tupi de São Paulo. Dois anos depois a mesma adaptação ganhou o comando de Mauricio Sherman na Tupi carioca. Lúcia Lambertini eternizou-se como a primeira boneca Emília em SP e Rio. Na minha memória emotiva, ela reina absoluta. Tia Nastácia foi criada por Isaura Bruno na paulicéia, atriz que anos depois deu vida à célebre Mamãe Dolores de “O direito de nascer”.
No Rio, Zeni Pereira.


A TV Cultura (1964) e a Bandeirantes (1967) também apresentaram suas versões, mas
a co-produção TV Globo-TVE  marcou duas décadas da nossa televisão, de 1977 a 1986, assinada por Geraldo Casé e apresentando uma das maiores criações da teledramaturgia nacional: Dirce Migliaccio como Emília. O desempenho de Dirce roubava cenas, tal o seu carisma, uma Giulietta Massina dos trópicos! Impagável.Ao seu lado também um elenco de prima: Zilka Salaberry, André Valli, Rosana Garcia, Julio César, Dorinha Duval, Paulo Cesar Soares e Tonico Pereira, entre os principais. Tia Nastácia dessa vez foi Jacira Sampaio.

De 2001 a 2007, a Globo investiu de novo no “Sítio” para as manhãs de sua programação sob a batuta de Márcio Trigo. E revelou uma Emília menina fascinante: Isabelle Drummond, hoje uma jovem e linda atriz de seu cast. Dhu Moraes criou uma Tia Nastácia mais jovem, magra e mais...descolada. Uma graça. Passei por lá, vivendo La Fontaine no episódio “A cigarra e a formiga”. Foi demais conhecer e contracenar com Isabelle, um momento mágico em minha vida.

 Calar Emília e acusar Monteiro Lobato é, sem dúvida, sinônimo de total desconhecimento do escritor, contista, ensaísta, tradutor e editor renomado da nossa literatura. Na semana passada, o aval definitivo para mim: Tatiana Belinky, amiga e a maior adaptadora de Lobato  afirmou no programa “Metrópolis” (TV Cultura) com todas as letras que ele jamais foi racista. No mesmo programa, uma historinha oportuna: Um dia, recebeu para jantar um escritor negro que muito admirava. Sua empregada recusou-se a servi-lo à mesa por ser negro. Lobato levantou-se e ele mesmo o fez .
Calar Emília é impossível. Zoar com Lobato é burrice.
 

sábado, 15 de setembro de 2012

O MITO NELSON RODRIGUES REVISITADO



Repórter policial, comentarista esportivo, dramaturgo, romancista e frasista irresistível, o pernambucano Nelson Rodrigues (1912-1980) celebra cem anos de solidão da viúva (porém honesta) cultura brasileira. Não ficamos completamente abandonados porque sua obra é peso pesado e, assim, ele se faz contemporâneo e absoluto.

‘O adulto não existe. O homem é um menino perene.’

‘Tarado é toda pessoa normal pega em flagrante.’

'Toda a unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar.

‘Jovens: envelheçam rapidamente!’

‘Toda mulher gosta de apanhar. Só as neuróticas reagem.’

‘Todo o desejo é vil.’

‘ O Fluminense nasceu com a vocação de eternidade...tudo pode passar...Só o Tricolor não passará jamais.’

‘Sexo é para operário’

Em "Asfalto Selvagem" Vera Vianna contracena com Maria Helena Dias

O mais importante dramaturgo brasileiro teve 17 peças montadas e 24 filmes rodados.“Asfalto Selvagem” (1964), dirigido por J.B.Tanko e estrelado por Vera Vianna no papel da Engraçadinha, revelou uma jovem atriz escolhida pelo autor para um teste, como ela conta em seu blog Quiprocós e Turumbambas (veravianna.wordpress.com), quando foi entrevistá-lo para o Jornal do Brasil:

“...Nunca havia representado e, irresponsável, aceitei. “Você é a Engraçadinha!”. Meu Deus! Escolhida pelo autor e aprovada pelo diretor e com toda a força do ator principal, o já então também famoso Jece Valadão... “Asfalto Selvagem” foi explosivo na época, subvertia o moralismo,a caretice, típicos da época... Foi proibido até 21 anos, discutido, aplaudido, arrasado, foi um autêntico momento rodriguiano. E teve continuação: “Engraçadinha depois dos trinta” (1966) – fiz então sua filha Silene, e Irma Alvarez no papel da Engraçadinha.”

Darlene Glória é Geni no genial filme de Jabor

Dentre as melhores transposições para a tela de Nelson Rodrigues, além destes dois filmes citados, destacam-se: “Toda a nudez será castigada” (1973) de Arnaldo Jabor, que revelou Darlene Glória para o estrelato, “Boca de ouro” (1962) com assinatura impecável de Nelson Pereira dos Santos, “A Falecida” (1965) de Leon Hirszman e protagonizado por Fernanda Montenegro, “O Beijo” (1965) numa ótica original de Flavio Tambellini para “O beijo no asfalto”, “A dama do lotação” (1978) e “Os sete gatinhos” (1980), ambos de Neville D’Almeida, “O casamento” (1975), na dobradinha do grande Jabor , “Traição”(1998), três crônicas muito bem adaptadas pelos ‘conspiradores’ Arthur Fontes, Cláudio Torres e José Henrique Fonseca e “Gêmeas” (1999) dirigido por Andrucha Waddington com Fernanda Torres.












Duas atrizes que marcaram no universo rodriguiano são Lucélia Santos e Alessandra Negrini. A primeira, estrelou a segunda versão de “Bonitinha, mas ordinária” para a telona, assinada por Braz Chediak em 1980. A cena em que Bonitinha é currada por cinco negros causou. Negrini estrelou junto com Claudia Raia a minissérie “Engraçadinha Seus amores Seus pecados” na Globo, em 1995, dirigida por Denise Saraceni. Causou também.

Vera, a primeira Engraçadinha, contracenando com Nestor Montemar

Vera Vianna, Lucélia Santos e Alessandra Negrini estarão no Sesi, em Sampa, no próximo dia 3 de outubro, participando da mesa de palestra e debate sobre o centenário de Nelson, evento organizado pelo escritor Ruy Castro, autor dos livros “O anjo pornográfico” e “Flor de obsessão”, ambos sobre o homenageado. São grandes atrizes bonitinhas e engraçadinhas, mas nada ordinárias, né não?

Salve Nelson Rodrigues!


POSTER DA SEMANA


scarlett moon de chevalier


sexta-feira, 7 de setembro de 2012

CÉLULA-TRONCO : REVOLUÇÃO NA MEDICINA



Tudo que é novo, choca. Apesar da resistência de conservadores e da igreja Católica, as pesquisas com células-tronco prosseguem obtendo resultados surpreendentes em todo o mundo. Digo, quase...elas geram polêmica em muitos países. As experiências são autorizadas apenas na Inglaterra, Austrália, Japão, Coréia do Sul, China e Israel. Nos Estados Unidos os estudos podem ser feitos, mas desde que patrocinados por instituições privadas. No Brasil, Lance, laboratório criado na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), é a primeira grande fábrica de célula-tronco inaugurada no Brasil. Em Petrópolis, funciona o único laboratório autorizado pela Anvisa para centrifugar o sangue colhido, o Excellion.

Dr Carlos Henrique Bittencourt, ortopedista e professor da UFF (Universidade Federal Fluminense), é expert e um dos maiores entusiastas do assunto. Ele pesquisa os efeitos do plasma há quatro anos e já aplicou a técnica com sucesso em pelo menos 400 pacientes. Entre os famosos, já se trataram,e estão em tratamento, nomes como Gloria Menezes, Tarcísio Meira, Leandra Leal, Hildegard Angel, Claudia Raia, Isabella Garcia e o príncipe dom Eudes de Orléans e Bragança, todos com problemas de tendinite, artrose ou outras lesões.

A técnica consiste em injetar componentes do próprio sangue do paciente na área lesionada, estimulando a regeneração e reparação dos tecidos ou cartilagens, e, assim, evitando a necessidade de cirurgia. As infiltrações do PRP (Plasma Rico em Plaquetas) corrige problemas de desgaste das articulações.

Foi durante a temporada da peça “Ensina-me a viver” que atriz Gloria Menezes procurou o doutor Carlos Henrique com problema grave no joelho direito, acompanhado de uma risoartrose que lhe dava dores lancinantes nos punhos. Submeteu-se, então, ao tratamento. Diz Gloria: “Em tempo recorde, menos de um mês, eu estava de volta aos palcos e sem dor alguma nos punhos.”

Bailarinos são os grandes beneficiados no tratamento, principalmente por desgastes nos quadris. Por isso mesmo, em 2007, Dr Carlos Henrique Bittencourt fez o mapeamento de trinta bailarinos profissionais do Rio e São Paulo. Do elenco do musical “Sweet Charity”,

Claudia Raia, a estrela do espetáculo, foi também se consultar com tendinites crônicas nos tendões patelares do joelho, mais tendinite de Aquiles e no ombro. Curou-se nos dois anos seguintes, e submeteu-se também a uma astroscopia – procedimento feito com sistema ótico de visualização do interior de uma articulação – no ombro.

“Foi impressionante a minha recuperação e a cicatrização. Em menos de uma semana meus movimentos de extensão, flexão e inversão estavam perfeitos e normais e a dor desapareceu”, confirma Raia.

Infiltração das células-tronco no joelho


Tiro na Tendinite de Aquiles

A jornalista Hildegard Angel aderiu às células-tronco depois que o príncipe dom Eudes de Orléans e Bragança lhe falou maravilhas do tratamento a que se submeteu, recuperando 100% das suas cartilagens. Em junho ela plantou cartilagens novas nos dois joelhos com artrose pelas competentes mãos do doutor Carlos Henrique, o Carrica, para os conhecidos.

“...Além do plasma sanguíneo, o material agora é retirado também da gordura da barriga, através de uma lipo, pois as células se concentram nos vasos sanguíneos em volta da gordura. Retirei a gordurinha e o sangue. Aguardei 45 dias enquanto o sangue foi centrifugado no Excellion, onde as células foram multiplicadas. Delas, um milhão para serem infiltradas em cada um dos meus joelhos e as demais foram congeladas para minhas futuras necessidades. E depois fiz a astroscopia no Hospital Samaratino,” corrobora animada Hilde.

O procedimento está revolucionando a ortopedia e não só ela. Mais de 300 doenças de diversas áreas, inclusive a insuficiência renal, também estão sendo beneficiadas pela chegada das células-tronco. Até para a calvície, cientistas japoneses criaram folículos capilares a partir das células-tronco. O ator Reynaldo Giannechini, acometido de um linfoma, recebeu em janeiro passado uma infusão delas como parte de um autotransplante de medula óssea. Agora, oito meses depois, já está gravando a nova novela “Guerra dos sexos” bem recuperado.

Ao sabor da memória, o primeiro a falar nesse assunto foi o ator Christopher Reeve, o Super Homem. Tetraplégico em 1995, tinha esperança de voltar a andar com a terapia das células-tronco. Mas foi traído em 2004, vitimado por um ataque cardíaco. Acreditava tanto na causa que criou junto com sua mulher a Christopher & Dana Reeve Foundation destinada a arrecadar recursos para financiar estudos nesta área, e que prossegue até hoje na ativa.

Quem sabe o Super Homem venha nos restituir a glória, mudando como um deus o rumo da história... por causa da célula-tronco. Ave!


sábado, 1 de setembro de 2012

CONVERSA DE TELESPECTADOR


Na agulha: A Fazenda (Record), Avenida Brasil (Globo) e Agora é Tarde (Band).


VIVIANE É UMA UVA

A fórmula do reality-show é febre na televisão aberta. Confinar uma galera por três meses, ou mais, rodeada de trocentas câmeras vigilantes é o segredo do formato, que preenche o seu tempo com provas, gincanas, premiações, privilégios e castigos. De casa, o voyerismo rola solto.

A quinta edição de “A Fazenda” acabou há poucos dias depois de 93 dias pontuando altos índices de audiência para a TV Record. A vencedora de duas milhas foi a modelo Viviane Araújo, uma super gata destaque das escolas de samba cariocas que mostrou garra e sinceridade na longa permanência do programa no ar.

E venceu com 84% da votação pública, o que lhe confere aprovação expressiva dos telespectadores. Viviane tem carisma. E não foi fácil colocá-lo pra fora: ralou pra caramba, se expôs, chorou e brigou, mas... depois colheu os frutos com a vitória triunfal. Meiga, gostosa e verdadeira, é diamante que merece ser lapidado.


UMA AVENIDA QUE É O BRASIL

A novela “Avenida Brasil” parou o país. Muitas novelas têm atingido a massa com expressividade, mas o que acontece atualmente com “Avenida Brasil” chega a ser surpreendente. Como tudo é estatística nesse mundo pós-muderno, fica claro que a história foi encomendada pela Globo para espelhar a classe C, que reina absoluta na avenida chamada Brasil. E espelha mesmo.

Ao lado de elenco estelar aparecem desconhecidos até então, que se destacam como autênticas revelações: Letícia Isnard (Ivana), Cacau Protásio (Zezé), Débora Nascimento (Tessália), José Loreto (Darkson), Fabíula Nascimento (Olenka), Juliano Cazarré (Adauto), Carol Abras (Begônia), Emiliano D’Avila (Lúcio) e as meninas Ana Karolina (Ágata) e Mel Maia (Rita menina) arrasam.

Mas o show de “Avenida Brasil” fica por conta dos embates entre Adriana Esteves (Carminha) e Débora Falabella (Rita/Nina). As duas brilham em igual intensidade, cada uma na sua identidade de grande atriz a serviço de personagens antagônicas e ferozes. João Emanuel Carneiro, o pai da criança, traz o know-how do cinema para a televisão. É show de bola em cada capítulo.


NUNCA É TARDE

“Agora é tarde” está provando que nunca é tarde para dar uma oxigenada no gênero talk-show. A Band começou devagar devagarinho botando no ar o programa duas vezes na semana. Agora já está de terça à sexta no mesmo horário do “Programa do Jô” , até então absoluto no formato talk-show. Aí rolam inevitáveis comparações, a começar pelo titular Danilo Gentili. Paulista, de Santo André, o humorista, escritor e publicitário Gentili de gentil não tem nada, mas sua presença é leve e engraçada como entrevistador de perguntas embaraçosas, ultrajantes e desrespeitosas. Treinado no Stand-Up, tem experiência de palco e timing afiados. Deu no New York Times: “Com seu rosto de bebê, o riso de menino pateta, Mr Gentili é o terrível infante da comédia no Brasil...”


Bem produzido - visualmente e ótima pauta – “Agora é tarde” tem a presença da banda Ultrage a rigor nos comentários e vinhetas musicais. E Gentili interage com certo ‘ultrage nada rigoroso’ com o super simpático Roger, o líder da banda. A gente dorme mais leve e mais inteligente assistindo o programa. Nunca é tarde.


O PRAZER DA LEITURA COLETIVA


Os grupos de leitura coletiva estão na moda. Existem diversos na cidade com ótima freqüência. A Estação das Letras do Flamengo mantém três grupos há 4 anos: Livros na Mesa, coordenado pela poetisa Lia Maya, o Curta Crônicas, organizado por Tânia Barroso e o Grupo Experimental de Leitura, nas mãos da dona da livraria, Suzana Vargas.

No GEL, participa a atriz Creusa Carvalho (a da ponta na foto com suéter enrolado). Saindo do universo de Guimarães Rosa com a leitura de “Grandes sertões: veredas”, o grupo está agora encarando “Dr Fausto” de Thomas Mann. Diz Creusa: “Cada um lê um pedaço e a gente, às vezes, interrompe para esclarecer alguma dúvida, acrescentar ou dar pitacos”.

A ideia é genial. Toda sexta feira, às 20h, rola na Estação das Letras: Rua Marques de Abrantes 177 lojas 107 e 108, Flamengo. Informações: 3237.3947.


Foto: Laura Marques (reprodução de O Globo, Revista Zona Sul)