sexta-feira, 22 de maio de 2009

ZÉ RODRIX, A ESPERANÇA DE ÓCULOS


O que fazer ao acordar e ouvir no rádio que o Zé vazou ?
De repente, sem estar doente ou dar sinais de ?


Com cabras pastando solenes no seu jardim, ZÉ RODRIX partiu para sua sonhada casa no campo. Adjetivo que se aplica a ele - Genial veste bem um talento de poeta e músico à flor da pele, que viveu sempre plugado na inspiração e em elevado senso de humor refinado. Trata-se literalmente de um gênio.

Ficamos amigos na juventude, primeiro no Tablado onde foi ator, depois no teatro profissional, onde fizemos cinco peças, todas brilhantemente musicadas por ele: “Miss Brasil”, “Tem Piranha na Lagoa”, “As Garotas da Banda”, “Bordel da Salvação” e “Independência ou Morte”. Pouco se conhece deste compositor, arranjador e maestro de musicais de teatro, onde produziu trilhas inspiradíssimas.

Elétrico, engraçado e sempre animado, mesmo que à volta a barra estivesse pesada, ele encarava as situações com um jogo de cintura único. No célebre show de Milton Nascimento e O Som Imaginário (onde pontificava ao lado de Wagner Tiso) no Teatro da Praia (1969), eu e Nestor Montemar fomos convidá-lo para fazer a partitura musical de “Miss Brasil” de Maria Clara Machado, montada no Teatro Opinião com direção de João Marcos Fuentes. Passamos a ter um convívio rico e fraterno na década de 70. Freqüentei sua casa, ainda casado com Lizzie Bravo em Ipanema, junto com Norma Suely, e a seguir estreamos no Circo New Catacumba, na Lagoa, uma revista zona sul que Paulo Afonso Grisolli dirigiu: “Tem Piranha na Lagoa”, que misturava Calderón de La Barca, esquetes do teatro de revista e sonetos de Shakespeare.


Como diretor musical da “Piranha”, montou uma banda afiadíssima, o Grupo Faia, com Cláudio Araújo, Vitor Larica, Luiz (in memoriam) e Ricardo, que resultou em atração especial dentro do espetáculo. Na foto acima, aparece ao fundo com os músicos.

“Tem piranha na lagoa, não importa que a mula manque, só sei que a maré ta boa... Deixa o jacaré nadar, deixa o que saiu , entrar, gosto de banana d’agua demais, deixa o jacaré nadar!”

Em “O Bordel da Salvação”, texto do irlandês Brendan Behan ( “The Hostage” ) dirigida por João das Neves, ele deitou e rolou, compondo temas contextualizados mas com sua marca criativa.

“Nunca mais atirem pedras na sua mãezinha, cuidado que ela bate as botas e a casa cai... É preferível atirar tijolos na cabeça do papai”,

cantavam Marieta Severo e Buza Ferraz em cena.

Para as personagens da sargento do Exército da Salvação (Norma Suely) e um conflituado ateu que se regenera (Emiliano Queiroz), criou um cântico religioso, “Nós somos os soldados do senhor...”

Na cena da retratação desvairada de três gays, ele surpreendia o público com um rock pauleira: “Somos Todos Viados”.

“Quando Sócrates na Grécia antiga sentava na sauna, e soltava fumaça e vapor pelo cú, eles gritavam à solta, todos muito animados, estamos aqui porque somos todos viados. Somos todos viados, somos todos viados, estamos aqui porque somos todos viados!”

No musical “Independência ou Morte” (1973) que comemorou o sesquicentenário da independência, criou lundus, blues, calypsos, foxes e marchas ranchos, e ainda regeu ao vivo orquestra com 30 músicos. A partitura desta peça nunca foi mostrada fora da encenação, apesar do próprio me ter dito que tempos depois, em seus discos, ter fragmentado vários temas. Eram belíssimos.

Para o primeiro encontro da Marquesa de Santos (Isabel Ribeiro) com D.Pedro (Nestor Montemar), ele fez o tema de Domitila, “Uma Estela Cintila”. Som feérico, tipo Broadway.

“O teu olhar no meu, anunciou que um novo amor nasceu e inspirou, uma paixão Domitila, maior que o céu e o mar, oh Domitila, o teu olhar !!
Uma estrela cintila no fundo deste olhar, oh Domitila eu sempre vou te amar!!!”

Depois que passou a residir em São Paulo poucas vezes nos vimos. Encontrei-o pela última vez na casa de Ana Santeiro, sua agente literária, no início do novo século. Grisalho, Maçon, mais sério e um tanto reservado, lhe perguntei se tinha saudade do teatro. Disse-me que não, só ótimas lembranças, estava focado em escrever e se dedicar à família e à Maçonaria. Ainda voltou a encontrar seus companheiros de estrada, Luis Carlos Sá e Guarabyra, para uma saideira musical. E pronto.

Com a Esperança de óculos, espero um sinal qualquer. Ele me escreveu um dia, “Não desligue nunca”. Assim, guardo a lembrança do seu humor, inteligência e grande companheirismo.
Do tamanho da paz. Luz, Zé !

6 comentários:

  1. Ele é um cantor incrivel,todo mundo
    só fala das músicas que ele fez, prestam pouca atenção na maneira como canta. A Elis canta muito bem mas já ouiviu ele cantando Casa no Campo? Arripia e faz a gente se emocionar, acho que agora vão descobrir o exelenete cantor que ele foi e será para sempre
    GALOCHA

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  2. É mesmo um grande poeta Buca, voce tem razão.
    Qanta saudade deixa em todos nós.
    Xuxu

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  3. linda reportagem, Luís. Sua família ficará muito contente quando ler. Ele, sem dúvida nenhuma foi um criador ímpar. Estamos perplexos e tristes com sua partida súbita, mas ele estará nos olhando do firmamento para que seguimos firme em levar sua arte adiante. Muito obrigada.
    beijo
    Ana Maria Santeiro

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  4. Atrazadissimo, mas não posso deixar de dizer que acompanhei o Zé, Sá e Gutemberg Guarabyra desde o Terra, tinha eu 15 anos, quando fui "apresentado" a ele. Senti muito foi ver a noticia na TV na manhã que fiz 55. Mais uma razão, daqui pra frente falar e tocar no meu violãozinho as canções deste mago ZÉ RODRIX. Não o conheci pessoalmente, assisti um show deles aqui em Santos quando retornaram mas o tinha como meu grande amigo, pois embalou como ninguem meus sonhos durante toda minha vida. Abs

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  5. oi luiz sergio! uma amiga me deu o link do seu blog agora de manhã - linda homenagem! lembro bem daquele tempo, anos 70, tanta criatividade no ar! o zé faz muita falta, parece incrível que ele tenha partido. quando ligo pra casa dele em sampa ainda parece que ele vai atender, dizendo sempre o número do telefone primeiro... uma coisa que pouca gente sabe, é que eu sou a esperança de óculos e a marya o filho de cuca legal. cantei com ele no festival da canção de 1971, gravidíssima, com um vestido comprado na loja da leila diniz. beijos

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